Sepé Tiaraju: fazendo memória pelos caminhos da luta e da resistência

Postado por: antonio.urquiza

Desde 2004, no mês de fevereiro, os Guarani marcam presença em São Gabriel para homenagear Sepé Tiaraju, símbolo da luta por uma Terra Sem Males. Recordam um guerreiro Guarani que lutou até as últimas consequências em defesa de seu povo e pelo direito de viver em paz em seu território. Sepé enfrentou no seu tempo os dois grandes impérios da época, Espanha e Portugal, os quais tinham interesses econômicos e políticos sobre os seus territórios. Sepé não lutou sozinho junto a ele encontravam-se milhares de Guarani e indígenas que não aceitaram deixar sua terra, seu território em troca de interesses políticos, econômicos, religiosos das grandes potências da época.

Sepé foi morto no dia 7 de fevereiro de 1756 pelos exércitos de Espanha e Portugal e no dia 10 do mesmo ano em Caiboaté foram massacrados mais de 1500 Guarani que lutavam em defesa de sua terra.

Os Guarani retomam não só a memória da luta de seus antepassados, mas também as suas lutas de hoje. Mobilizados, através de encontros entre as aldeias e de reuniões com os órgãos públicos, os Guarani têm relatado a sua realidade em busca de soluções, mas pouco se tem avançado. Dentre os 7 GTs reivindicados pelos caciques e Conselho de Articulação do Povo Guarani (CAPG), apenas dois estão em curso: um nas terras indígenas de Itapuã, Ponta da Formiga e Morro do Coco e outro em Passo Grande, Petim e Arroio do Conde. Graças a essa mobilização e articulação das comunidades a história dos Guarani continua viva, resistente e mística.

Nos escritos da época das missões Jesuíticas, muito se disse sobre como os Guarani viviam nas chamadas Reduções Missioneiras. Hoje os escritos autênticos sobre a vida do povo Guarani são extremamente diferentes daquela época. Hoje os relatos dão conta de que os Guarani do Rio Grande do Sul habitam as margens das estradas ou em espaços reduzidos, vivendo em extrema dificuldades, sendo a principal delas a falta da terra.

Sem terra, dizem as lideranças indígenas, não há como se autossustentarem, não há saúde para as crianças, não há como plantar, não há mato para tirar os remédios para as curas de enfermidades, não há espaço para o Sagrado. Em cada encontro do Sepé, em São Gabriel, os Guarani fazem seus rituais a Nhanderu pedindo força, luz, caminho e rumo para seguir na luta do dia a dia.

Sempre em cada Encontro do Sepé eles elaboram documentos às autoridades dos órgãos federais (Ministério da Justiça, Fundação Nacional do Índio-Funai, Secretaria Especial de Saúde Indígena-Sesai e para o Ministério Público Federal-MPF) e, portanto, não há desculpas desses órgãos em dizer que desconhecem a realidade Guarani no sul do país.

E o mais trágico é que tanto a Funai quanto a Sesai participam, através de seus representantes da região, mas não levam respostas verdadeiras para os Guarani, apenas falsas promessas. Os Guarani reivindicam e almejam que as suas terras sejam demarcadas e querem viver em sua cultura, plantando suas roças com as suas sementes tradicionais, querem sossego e saúde para as crianças e para os mais velhos. Saúde para os Guarani, além de sua terra demarcada, é vida digna sem mentiras, enrolações, enganos e outros meios usados contra os indígenas para que seus direitos não sejam garantidos. Cabe ao governo federal, da presidenta Dilma, Ministro da Justiça, Funai e Sesai executar uma política séria em relação aos povos indígenas e cumprir a Constituição nos seus artigos 231 e 232.

Durante o encontro do Sepé, através da Palavra, os Xeramõi e Jariy – lideranças mais velhas – alertaram que a situação está cada vez mais difícil, por que os Juruá – os brancos – não os ouvem, não os veem, não os reconhecem, não demarcam as suas terras, não atendem as suas reivindicações, não respeitam os seus direitos originários, não têm interesse em resolver as grandes questões e problemas em que vivem os Guarani. Inspirados pelas palavras dos mais velhos, as lideranças dizem: os Juruá, as autoridades governamentais e parlamentares, que insistem em elaborar projetos de lei contra as demarcações de terra, falam falsas palavras, não dá mais para acreditar neles.

Na Sanga da Bica onde foi morto Sepé Tiaraju os Guarani entoam, a cada ano, seus cantos a Nhanderu, agradecendo ao Deus Verdadeiro por caminhar sempre com eles. As Kuña Karai e os Karai transmitem a força de Nhanderu para as lutas do cotidiano, ressaltando a importância de estarem unidos, fortalecidos e articulados para enfrentarem os Juruá e suas falsas promessas. Bradam em voz alta: “viva o Sepé, a terra é dom de Tupã, dada aos homens para que seja cuidada, protegida, amada e respeitada”. Essas manifestações de utopia e esperança alimentam o sonho da Terra Sem Males e fortalecem, através da memória dos guerreiros  e guerreiras que tombaram em defesa da vida e do território Guarani, o ideal de que a luta não será em vão, jamais.